segunda-feira, 31 de agosto de 2020

Estudo diz que chikungunya pode afetar o cérebro

Estudo realizado por equipe internacional de pesquisadores com apoio da Fapesp revela que a infecção pelo vírus chikungunya pode causar sintomas para além de febre, cefaleia, erupção cutânea e dores articulares e musculares. A análise, realizada por 38 pesquisadores da Universidade Federal do Ceará (UFC), Universidade de São Paulo (USP), Ministério da Saúde, Imperial College London e Universidade de Oxford, indica que o patógeno é capaz de invadir o sistema nervoso central e comprometer funções motoras.

“Além da possibilidade de o vírus infectar o sistema nervoso central, identificamos também que a letalidade da doença é maior em adultos jovens e não em crianças ou idosos, como se costuma prever em surtos da doença. A investigação mostra ainda que pacientes com diabetes parecem morrer com frequência sete vezes maior durante as fase aguda e subaguda da doença [entre 20 e 90 dias após serem infectados] que indivíduos sem a comorbidade”, diz William Marciel de Souza, pesquisador da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP e coautor do artigo publicado na revista Clinical Infectious Diseases.

O chikungunya é transmitido por meio da picada de fêmeas dos mosquitos Aedes aegypti e Aedes albopictus. Os sintomas mais comuns são febre alta, dores de cabeça, nas articulações e nos músculos, náusea, fadiga e erupções na pele – por três semanas após a infecção. Depois desse período, alguns pacientes evoluem para a fase subaguda, com a persistência desses sintomas. Em certos cenários, a dor nas articulações persiste por mais de três meses, indicando a transição para o estágio crônico, que chega a durar anos.

Como foi feita a investigação

O trabalho teve como base uma ampla gama de dados clínicos, epidemiológicos e amostras laboratoriais de pacientes que morreram durante o maior surto da doença nas Américas, ocorrido no Estado do Ceará, em 2017. Na época, foram registrados 105 mil casos suspeitos e 68 mortes. A documentação dos dados coletados durante a epidemia foi realizada pelo Serviço de Verificação de Óbitos da Secretaria de Saúde do Ceará.

Continua após a publicidade

Os cientistas também verificaram os prontuários médicos e observaram que a maioria dos infectados que morreram durante o surto no Ceará apresentou síndrome neurológica – lesões no sistema nervoso central que podem ser altamente incapacitantes por comprometerem as principais funções motoras.

Das 36 amostras de tecido cerebral de indivíduos que vieram a óbito, quatro (ou 11%) continham o micro-organismo. “A presença do vírus dentro do cérebro significa uma caracterização clara de que ele consegue causar uma infecção no cérebro e na medula espinhal”, explica Souza.

Pessoas mais vulneráveis às complicações do chikungunya

Além das novas características da infecção, os pesquisadores identificaram que o risco de morte nas fases agudas e subagudas era sete vezes maior em pacientes com diabetes. “Essas novas informações deverão contribuir para o reconhecimento de fatores causadores de gravidade”, pondera Luiz Tadeu Moraes Figueiredo, professor da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da USP, que também assina o estudo.

Os pesquisadores também revelaram padrões inesperados para epidemias de arboviroses. Por exemplo: segundo o experimento, idosos e crianças não representam os grupos etários com maior risco de morte. Pelo contrário, entre os mortos no surto de 2017, a maioria era de adultos (40 anos ou mais).

Continua após a publicidade

De acordo com Souza, o achado reforça que, em um surto como o ocorrido no Ceará, não necessariamente o grupo de maior risco envolve as pessoas com o sistema imunológico suprimido ou deficiente. “Eram adultos jovens e saudáveis e não havia comorbidade relacionada na maioria dos casos. Isso adiciona mais uma camada à doença e pode ser uma informação de extrema importância para a prática clínica”, argumenta.

Mas ele destaca que os pacientes que morreram tinham uma variação etária grande. Havia óbitos de crianças com 3 dias de idade até pessoas com 85 anos.

*Esta reportagem foi publicada originalmente pela Agência Fapesp.



Medir a temperatura para detectar o coronavírus é eficaz?

Aquele termômetro digital com sensor infravermelho — que mede a temperatura de alguém ao ser apontado contra a sua testa — virou equipamento de trabalho comum dos seguranças que controlam a entrada de parques, mercados, lojas, escritórios etc. Com a reabertura do comércio e a flexibilização da quarentena, ele vem sendo usado como um instrumento para detectar indivíduos com coronavírus (Sars-CoV-2) que seguem circulando por aí. Mas essa é uma estratégia eficiente para frear a transmissão?

Especialistas e estudos consultados pela reportagem indicam que não. “Existe uma grande possibilidade de pessoas assintomáticas, pré-sintomáticas ou mesmo com outros sintomas, mas sem febre, entrarem no estabelecimento e o contaminarem”, destaca Sylvia Lemos Hinrichsen, infectologista consultora da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI).

O método se baseia na experiência com epidemias anteriores, que foram disparadas por parentes do Sars-CoV-2. Entretanto, no caso do novo coronavírus, a febre não parece ser um sintoma tão importante assim. “Estudos já demonstraram que a temperatura acima de 38°C aparece em menos de metade das pessoas com Covid-19”, explica o infectologista Leonardo Weissmann, também da SBI.

Até pode ser que um episódio da doença seja descoberto na fila do mercado, servindo de motivo para uma visita ao médico. “Mas, de modo geral, isso não tem acontecido nos outros países. Os estudos mostram que poucos casos são flagrados desse jeito”, diz Sylvia.

Continua após a publicidade

Tanto que, por ora, não existe uma orientação oficial sobre essa medida em órgãos como o Ministério da Saúde. Em nota técnica, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) não recomenda que o termômetro seja usado como parâmetro único de triagem de viajantes que chegam ao país.

A medição de temperatura já fracassou no passado

O pneumologista Gustavo Prado, do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, em São Paulo, lembra que essa tática em massa falhou com outras doenças. “Há mais de uma década, vários aeroportos adotaram essa estratégia contra o vírus H1N1 da gripe. A grande maioria casos nos viajantes internacionais não foi acusada pelo termômetro”, aponta.

Situação semelhante ocorreu com o ebola. “Alguns países passaram a medir a temperatura de todos os passageiros oriundos da África, mas nenhum caso fora do continente foi detectado dessa maneira”, destaca Prado.

O número do termômetro pode ser impreciso

Além do alto índice de pacientes que carregam o coronavírus sem apresentar febre, há uma segunda limitação do método. O termômetro infravermelho precisa de condições específicas para executar seu trabalho com acurácia.

Continua após a publicidade

“A temperatura superficial da testa não reflete muito bem a temperatura central”, aponta Prado. Se você passou um produto cosmético ou estava no ar condicionado, por exemplo, ela tende a ficar mais baixa. Por outro lado, ao correr ou pegar bastante sol, pode subir um pouquinho.

“Fora que o indivíduo pode ter tomado um medicamento anti-inflamatório, analgésico ou mesmo antitérmico, que abaixam a temperatura”, completa o pneumologista. Ou seja, se a pessoa estiver infectada, mas tratando uma dor de dente ou de joelho, correria um risco ainda maior de passar despercebida pela triagem. Hora do dia e idade são outros fatores que influenciam nos valores apontados pelo termômetro.

Por último, o dispositivo em si deve ser manuseado com perícia, seguindo as orientações do fabricante. Quanto mais distante o equipamento fica da testa, maior o risco de erro. Ah, é necessário que a lente ou o sensor estejam perpendiculares ao alvo — e devidamente limpos.

Termômetro infravermelho não afeta a glândula pineal

Ele pode até não ser a coisa mais importante para conter a Covid-19. Mas também não faz mal.

Continua após a publicidade

Recentemente, um boato nas redes sociais alegava que usar o termômetro infravermelho afetaria a glândula pineal, estrutura do cérebro responsável por secretar a melatonina, também chamada de hormônio do sono. Segundo essa notícia falsa, o cérebro todo estaria em risco.

Fique tranquilo: o laser do termômetro digital sequer penetra tão profundamente no corpo. “Trata-se de mais uma informação falsa. Por causa desse receio, há quem peça para que a temperatura seja verificada pelo pulso, o que também está errado”, elucida Weissmann.

Como poderia ser feita uma triagem adequada contra o coronavírus?

Estamos navegando por mares ainda desconhecidos, porém um rastreamento ideal provavelmente envolverá um conjunto de estratégias. Isso porque a Covid-19 se manifesta de maneira diferentes entre as pessoas — apostar em só um parâmetro (temperatura, oxigenação do sangue, presença de tosse…) sempre envolverá um risco.

Uma possibilidade é aplicar questionários sobre alguns sintomas comuns, além da febre: tosse, dificuldade para respirar, dor no corpo, dor de garganta, diarreia, perda de paladar ou olfato, contato com casos suspeitos ou confirmados. Aliás, indivíduos com quadros assim sequer deveriam se expor, a não ser que seja para ir ao hospital ou para uma consulta.

Continua após a publicidade

Mais do que tudo, deve-se apostar em comunicação bem-feita e fiscalização das medidas de prevenção reconhecidas pela ciência: lavar as mãos com frequência, disponibilizar álcool em gel, limitar a circulação, proibir aglomerações, respeitar o distanciamento social e tornar obrigatório o uso de máscaras.

Resumo da ópera: não pense que, só porque um estabelecimento faz a checagem de temperatura na porta, o ambiente interno está livre de Covid-19. Em conjunto com os protocolos já consagrados de prevenção da transmissão, o termômetro pode ter uma utilidade marginal — nada além disso. “Ele talvez iniba as pessoas a saírem de casa se estiverem sentindo algo”, conclui Weismann.



Vacinação contra o sarampo é prorrogada: até quando vai e quem deve tomar?

Brasileiros de 20 a 49 anos agora tem até o dia 31 de outubro de 2020 para tomar a vacina contra o sarampo. O Ministério da Saúde ampliou a campanha de vacinação dessa faixa etária — que originalmente terminaria no dia 31 de agosto — por causa da baixíssima adesão.

Segundo comunicado do governo, desde o início da quarta etapa da Mobilização Nacional de Vacinação Contra o Sarampo, pouco mais de 5 milhões de pessoas entre 20 e 49 anos receberam sua dose, o que corresponde a somente 5,8% desse público-alvo.

Para controlar a doença por meio da imunidade coletiva, estima-se que 95% da população deve estar imunizada. O sarampo está entre as infecções com maior capacidade de transmissão.

A campanha começou em 2019, quando irrompeu um surto do vírus no país. As duas primeiras etapas ocorreram no ano passado, com o objetivo de vacinar crianças de 6 meses a menores de 5 anos de idade e, depois, jovens de 20 a 29 anos. O terceiro estágio teve como público-alvo as pessoas de 5 a 19 anos e ocorreu entre 10 de fevereiro a 13 de março de 2020.

Continua após a publicidade

A turma dos 20 aos 49 anos figura entre as priorizadas por supostamente ter uma menor taxa de vacinação na infância contra o sarampo. E porque houve uma mudança no calendário de vacinação que interfere na proteção contra essa infecção no longo prazo. Logo, quem é mais velho pode não ter se imunizado adequadamente.

Atenção: mesmo os brasileiros de 20 a 49 anos que já receberam as picadas na infância devem ir aos postos para uma dose de reforço. Embora seja bastante eficaz, a vacina contra o sarampo pode não proteger adequadamente alguns indivíduos. E a vacinação extra minimiza esse risco.

Os casos de sarampo no Brasil em 2020

De acordo com o último Boletim Epidemiológico do Ministério da Saúde, do início do ano até 25 de julho foram confirmadas 7 293 infecções em 21 estados. Entre eles, destacam-se: Pará (4 713 casos – 64,6% do total), Rio de Janeiro (1 241 casos – 17%), São Paulo (721 casos – 9,9%), Paraná (305 casos – 4,2%) e Santa Catarina (111 casos – 1,5%).

No momento, o país registra cinco mortes por sarampo, sendo três no Pará, uma no Rio de Janeiro e uma em São Paulo. Todas as regiões do Brasil apresentam surto do problema.

Continua após a publicidade

Quem mais deve tomar a vacina do sarampo?

Apesar da campanha em andamento, esse imunizante segue disponível o ano todo para crianças e adultos em certas condições. Clique aqui para acessar o Calendário Nacional de Vacinação.



domingo, 30 de agosto de 2020

Emagrecendo sem juros

Há uma máxima comum da cultura das dietas: “Toda vez que eu engordo, faço uma ‘dietinha’ para emagrecer”. Mas eu quero propor uma inversão desse pensamento: busque adotar uma alimentação que mantenha você magro e, quando quiser e planejar, dê uma “abusadinha” — voltando ao padrão na sequência.

Alimentação saudável não é uma coisa temporal, que você deve fazer por um tempinho. Ela não tem peso de início e peso de término. Com o raciocínio das dietas, tendemos a adotar comportamento binário: em um momento posso tudo e, no outro, não posso nada.

Vamos fazer um paralelo com aquele projeto de trocar um carro usado por um novo. Para completar o dinheiro que falta, dá para ir ao banco e pegar um empréstimo. Mas, no final das contas, os juros do banco farão você pagar um valor muito mais alto do que o do automóvel. Voltando à sua alimentação: se todo dia comer algo a mais que não está planejando, você vai engordar lentamente.

O pior é que menosprezamos as calorias contidas nessas escapadinhas do dia a dia. Eu me refiro ao chocolatinho, ao docinho, ao vinhozinho, ao pedacinho de pizza a mais… Tudo no diminutivo, mas as calorias continuam sendo ingeridas por inteiro. Que nem aqueles “jurozinhos” do banco, que no fim sujam seu nome na praça.

Continua após a publicidade

Experimente virar o jogo. Ou seja, em vez de sempre incluir um “diminutivo” mais no seu cardápio diário, tire um. Hoje comerei um chocolatinho a menos, ou tomarei um vinhozinho a menos. Busque pequenas mudanças, que podem ser cumpridas no longo prazo.

O resultado será a economia de estresse que uma dieta impõe, sem abrir mão de tudo que você gosta. Claro que você pode continuar desfrutando chocolates, vinhos ou o que for. O ponto é: planeje-se para consumi-los em momentos específicos. E evite aquele repeteco desnecessário, que nem vai trazer mais tanto prazer. Poupe a ingestão das calorias sempre que puder no seu dia a dia.

Com isso, você vai esquecer essas dietas com começo, meio e fim — que simplesmente não funcionam no longo prazo. Evitá-las e pensar na alimentação como algo que você deve prezar a vida inteira é a forma de programar uma vida magra.

O melhor é que, em uma alimentação equilibrada, todas as comidas são permitidas, desde que o consumo seja consciente. Arregace as mangas e faça suas escolhas, evitando os diminutivos e economizando os “juros” em calorias das dietas.



sábado, 29 de agosto de 2020

Os dados vão mudar o futuro da medicina mas ainda há quem resista a eles

Em uma consulta, o paciente responde a um questionário, escrito ou oral, relatando seu histórico de doenças e os sintomas que está sentindo. Com essas informações, o médico solicita diversos exames, ou seja, busca mais informações sobre o problema e, de posse delas, consegue chegar ao diagnóstico e ao prognóstico. Essa é a rotina comum a todos os hospitais e consultórios e que se repete a cada atendimento.

E se todos esses dados pudessem ser combinados e tratados de forma automática, oferecendo novas possibilidades de análise e uma visão mais completa para determinar orientações e políticas de prevenção e bem-estar? É justamente esse questionamento que está instigando os principais players de medicina do país.

A tecnologia avançou significativamente nos últimos anos e as soluções de coleta, análise e tratamento de grandes volumes de informações finalmente chegaram ao setor da saúde. Hoje, não faltam opções para médicos e cientistas que desejam combinar diferentes informações para desenvolver os melhores serviços e atendimentos à população.

O mercado global de inteligência artificial, por exemplo, deve saltar de 4,9 bilhões de dólares em 2020 para mais de 45 bilhões em 2026, segundo estimativa da consultoria MarketsandMarkets.

Continua após a publicidade

O problema é que, por mais que a tecnologia esteja disponível, há uma barreira cultural que precisa ser ultrapassada. Os profissionais de medicina não sabem trabalhar com os dados existentes (e em número cada vez maior) porque não precisaram lidar com eles ao longo de sua formação. Ainda hoje a maioria das escolas de medicina não ensina a importância dos dados ou do big data em sala de aula. Como as fontes de informação eram reduzidas e o acesso era limitado, os profissionais contavam com o conhecimento adquirido na universidade e, principalmente, com a destreza de fazer o diagnóstico correto a partir dos sintomas descritos.

Mas o mundo mudou muito nos últimos anos – e o setor de saúde acompanhou as transformações. Atualmente, o médico precisa acessar diferentes conteúdos técnicos para se manter atualizado, atender um número grande de pacientes, com diferentes características e particularidades e, principalmente, antever sintomas e doenças para garantir mais qualidade de vida em vez de só prescrever tratamentos.

Como se vê, os dados estão cada vez mais presentes na rotina médica e em um volume crescente e gigantesco. Não dá mais para ignorar e confiar apenas nos conhecimentos e instintos individuais.

Somente com o cruzamento de todas essas informações é possível ter uma visão mais clara da situação e identificar as melhores soluções. A pandemia de Covid-19 evidenciou essa necessidade. Sem a análise acurada dos dados sobre a doença, é praticamente impossível adotar medidas eficazes de contenção e prevenção.

Continua após a publicidade

A Nova Zelândia e a Coreia do Sul, por exemplo, dois dos países com melhor desempenho no combate ao novo coronavírus, conseguiram combinar dados digitais demográficos com informações clínicas para prever as regiões que poderiam ter uma explosão de casos por conta do deslocamento das pessoas infectadas. E agiram a partir daí.

Utilizar com critério essa massa de informações disponíveis já é uma realidade no dia a dia de profissionais e instituições de saúde. Para o médico, o aprendizado sobre os dados vem se somar ao conhecimento sobre sinais e sintomas, diagnósticos e particularidades clínicas. É a partir do cruzamento desses campos que consultórios, clínicas e hospitais podem ampliar seu poder de análise e identificar o que deve ser feito e oferecido para melhorar a vida dos pacientes.

É uma tendência da qual não adianta fugir. Saber se adaptar a ela é o que vai permitir que médicos e hospitais possam prestar o melhor atendimento à população.

* Daniel Christiano é físico médico e líder da vertical de saúde da Semantix



sexta-feira, 28 de agosto de 2020

Coronavírus: o que o caso confirmado de reinfecção significa na prática?

Pesquisadores de Hong Kong relataram o primeiro caso confirmado de reinfecção pelo novo coronavírus (Sars-CoV-2), causador da Covid-19. O paciente é um homem de 33 anos que pegou o vírus, foi curado e, quatro meses depois, voltou a ser contaminado..

A confirmação veio após os pesquisadores checarem, com exames confiáveis, que o Sars-CoV-2 responsável pela segunda infecção tinha um material genético ligeiramente diferente do que havia invadido o organismo desse homem tempos antes.

Ou seja, não é que o mesmo vírus havia se escondido em algum canto do corpo para voltar a aparecer. Era realmente outra infecção. O fato foi relatado em um estudo, publicado no periódico científico Clinical Infectious Diseases.

Apesar de, em um primeiro momento, a notícia provocar certo pânico, não entre em desespero. “Primeiro porque essa pequena mutação não torna o Sars-CoV-2 mais perigoso do que já conhecemos”, afirma o virologista Paulo Eduardo Brandão, professor da Universidade de São Paulo (USP).

Continua após a publicidade

De acordo com o especialista, o resultado apenas reforça a suspeita de que a imunidade contra o coronavírus pode ter um prazo de validade. “Isso era esperado. É um padrão dos integrantes da família desse vírus”, aponta.

Em outras palavras, é possível que quem já pegou Covid-19 volte a ser infectado pelo novo coronavírus tempos depois. Mas, no momento, nem sabemos se isso é uma regra, ou exceção. É importante agora que os cientistas busquem outros casos semelhantes para tornar os dados mais robustos.

Mas certas especulações podem ser feitas. Segundo Brandão, é possível que uma eventual vacina precise ser reaplicada de tempos em tempos para manter o corpo imune. Cabe só ponderar que a resposta imunológica disparada pela vacinação é diferente da natural — ou seja, não dá pra saber se haveria possibilidade de reinfecção pelo coronavírus após a injeção.

De qualquer jeito, se isso acontecesse, não seria uma questão inédita para a humanidade. A vacina da gripe, por exemplo, deve ser tomada anualmente. No Brasil, ela é oferecida gratuitamente na rede pública de saúde para certos grupos de risco.

Continua após a publicidade

A diferença é que, no caso da gripe, a reaplicação é realizada porque o vírus influenza sofre mutações constantes — e diferentes cepas ganham espaço a cada ano. “Já o Sars-Cov-2 tem um relógio lento. Ele não vai mudar significativamente em um curto período de tempo”, informa Brandão. “A revacinação para a Covid-19 não teria a ver com a mutação do agente infeccioso, mas com a baixa duração da imunidade”, arremata.

 

E no dia a dia, muda alguma coisa?

A nova infecção do paciente de Hong Kong, ao contrário da primeira, foi assintomática. Olhando o copo meio cheio, daria para imaginar que, se uma pessoa pegasse de novo o coronavírus, os sintomas pelo menos seriam mais brandos, uma vez que seu organismo estaria minimamente preparado. Porém, Brandão pondera que não dá para fazer esse tipo de afirmação com base em um único caso.

“Talvez ele estivesse num momento imunológico bom para combater a doença”, comenta o professor. Em outros dois pacientes que teriam pegado o coronavírus de novo, um na Holanda e outro na Bélgica, sintomas da infecção foram notados.

Continua após a publicidade

E mais: mesmo que a gravidade da doença seja menor, ainda assim a reinfecção, se for relativamente comum, facilitaria a transmissão do novo coronavírus. Enquanto a vacina não chega, precisamos ter em mente que a possibilidade de uma segunda onda — e até uma terceira — existe.

Além disso, a descoberta mostra que mesmo quem já teve Covid-19 não pode relaxar na prevenção. “As pessoas têm que continuar resistindo, usando máscara, mantendo o distanciamento social e evitando aglomeração. Não é hora de baixar a guarda”, conclui Brandão.

 



OMS cria metas para eliminar o câncer do colo de útero

Apesar de prevenível com vacinação e detecção precoce do HPV e de ter uma chance de cura que beira o 100% se flagrado em estágios iniciais, o câncer de colo de útero ainda é muito comum e perigoso. Esse tumor, o quarto mais frequente no público feminino, matou 300 mil mulheres só em 2018.

Pensando nisso, a Organização Mundial da Saúde (OMS) lançou recentemente um guia para acabar com esse câncer até 2030. A entidade considera que ele estará eliminado quando todos os países mantiverem uma taxa de incidência menor do que quatro casos em cada 100 mil mulheres.

Por aqui, são 151 brasileiras com a doença para cada cem mil — cruzando os dados da nossa população do IBGE com informações do Instituto Nacional de Câncer (Inca). São estimados 16 590 novos casos e cerca de 6 500 mortes ao ano. No Brasil, ele é o terceiro câncer mais comum no sexo feminino e o quarto que mais mata.

Vacinação contra HPV precisa aumentar

A estratégia da OMS se baseia em três pilares: prevenção pela vacinação do HPV, rastreamento de lesões pré-cancerosas e tratamento e assistência com cuidados paliativos às portadoras de tumores de colo de útero invasivos (que já se disseminaram para outras camadas do órgão ou partes do corpo).

Continua após a publicidade

Pra quem não sabe, o HPV é a infecção sexualmente transmissível mais comum no mundo — a sigla remete ao papilomavírus humano, intimamente ligado ao câncer cervical. Após invadir o organismo feminino, ele pode promover alterações no DNA das células do colo do útero que, com o tempo, fomentam um tumor.

A maioria das mulheres já entrou em contato com algum tipo de HPV, alguns deles mais cancerígenos que outros. Embora a camisinha reduza bastante o risco de infecção, ela não o zera. Mais um motivo para tomar a vacina.

Esse inimigo da saúde pode ser flagrado com um teste de HPV. Já as primeiras lesões que ele provoca são detectáveis com o Papanicolau, um exame simples, feito no consultório do ginecologista. Com diagnóstico precoce, dá para remover essas lesões antes mesmo de elas virarem um câncer.

Para eliminar o câncer de colo de útero como um problema de saúde pública, a OMS acredita ser necessário vacinar 90% das meninas de até 15 anos contra o HPV até 2030. No Brasil, o imunizante está disponível gratuitamente no Sistema Único de Saúde (SUS) desde 2014 e é indicado para meninas dos 9 aos 14 anos e para meninos de 11 a 14, entre outros públicos.

Continua após a publicidade

O fato é que ainda estamos longe de atingir esse objetivo. Pouco mais de 40% das adolescentes no país recebeu as duas doses recomendadas, segundo as estimativas mais recentes do Ministério da Saúde, de 2018.

Além dos 90% de cobertura vacinal, estão entre as metas da OMS fazer exames de rastreamento em 70% das mulheres até os 35 anos e tratar 90% das diagnosticadas com lesões pré-cancerosas ou malignas até 2030. Em troca, 62 milhões de mortes seriam evitadas até 2120, de acordo com a Organização Mundial da Saúde.